Meu nome é Leonardo Silveira Handa. Jornalista. Perdido. Achado. Amante. Radialista.

sexta-feira, novembro 27, 2015

O amor é caos



O seu lado do guarda-roupa ainda está vazio. Encaro a porta todos os dias, ao acordar. O sentimento? Não sei explicar. A intenção de deixá-lo assim, menos ainda. Minhas coisas continuam atoladas nos espaços que me foram cabidos e designados. Tudo meio embolado, conforme a vida nesse momento. Mesmo assim, sei onde estão todos os objetos e roupas. Ou seja, há uma organização no caos.

Aqueles bilhetinhos de amor outrora colados no móvel não se encontram mais. Confesso que foram rasgados. Arrependo-me de tal ato. Tinham mensagens ali que eram lindas: escritas em momentos de sinceridade original. Talvez o imediatismo de apagar as memórias me levou a covardemente tomar a atitude do desapego. Porém, me pego a cada duas horas a relembrar aquelas frases que jorravam amor.

Estou dormindo do outro lado da cama que, aliás, não é a mesma. Tive que me desfazer da antiga, pois não conseguia mais repousar nela. Sentia uma angústia terrível ao me deitar e perceber que você não estava ao meu lado, roçando suas pernas às minhas, reclamando do meu hálito, implorando por uma conchinha ou roubando o meu edredom. Sinto saudades horríveis dessas vivências.

Na parede, as poesias do Cummings e do Drummond foram apagadas. No lugar, fiz um mosaico com os quadrinhos que adornam os postais e os pôsteres que compramos em Montevidéu. Recentemente, abri uma sacola onde guardamos lembranças da capital do Uruguai. Cheguei até a sentir o cheio do bairro de Pocitos e recordei cada detalhe da longa caminhada que fizemos pela orla do local. Parecia que estávamos dentro de um livro do Ricardo Piglia. O sol brilhava esplendoroso naquele dia, refletindo grandiosamente no rio (que parece mar), justificando o seu nome, Del Plata. Foram horas de paz incríveis, com observações sobre a vida, o futuro, o momento, as pessoas e as paisagens. Talvez seja a consumação de convívio mais marcante que sobrevivi contigo. Ao escrever isso, molhei o teclado do meu notebook.

Eu só queria dizer que aquela canção do Wado ainda faz sentido. Entretanto, a dor não passou. E eu continuo não gostando da Katy Perry, apesar de que quando ouço Fireworks, recordo do seu jeito bobo de dançar.

Dias atrás, acordei de um sonho desesperado. Você fugia de mim e corria ao redor de um grande cubo, o qual não lembro a cor. Quando eu consegui te alcançar, misteriosamente, uma placa apareceu em suas mãos com os dizeres: eu te amo. Abri os olhos, marejados. Levantei, fui à cozinha, bebi água com açúcar, tomei um tranquilizante e tentei voltar ao sonho. Mas não te encontrei.


Como é estranho em situações assim sermos desnudos com os nossos sentimentos. Uma clareza dos erros e dos acertos é límpida como água mineral. Quando observamos de longe temos mais visão para analisar os acontecimentos. A imaginação flui atônita. Fico desenhando em pensamentos como você está, se sente saudades, se abre sorrisos quando relembra momentos ou se gostaria de me rever um dia. Enquanto isso, sem razão para isso, seu lado do guarda-roupa continua vazio. Nem sei por que escrevo o seu lado, pois na prática, o lado agora é só meu. Na teoria, não. E o amor é prática e teoria, é direito e é esquerdo: carne e unha, alma gêmea... as metades da laranja. O amor é isso, é Fábio Júnior, é breguice e é escárnio. É caos.