Meu nome é Leonardo Silveira Handa. Jornalista. Perdido. Achado. Amante. Radialista.

segunda-feira, setembro 29, 2008

José Dirceu estava errado

Vivemos em uma época de urgência. Já sabemos o sabor antes de experimentar e criticamos antes de analisar. Estamos perdidos na depressão da falta de tempo, uma doenças sem receita para adquirir. Poucos ainda conhecem o prazer da observação: da frase inspiradora ao solo de piano.

Os românticos, de fato, encontraram o vaso sanitário e desceram até o esgoto da conformidade. Nossos acadêmicos não têm mais ideais. A própria faculdade está moldando mentes com atitudes de butique e conceitos pré-fabricados e viciados. Os velhos mestres morreram em suas próprias sombras. Os conselhos são verdadeiros tratados que enaltecem o poder capital. Os sentimentos são instantâneos. Nossos jovens desconhecem Jean-Luc Godard, não transam Caetano fase 1960-1970 e nem sabem da Brigidet Bardot.

Como cobrar de uma classe se nem mesmo os docentes têm referências. Nossos professores se encontram em um estado de inércia que chega a arder os olhos em desânimo. Onde estão os agentes do ensino-aprendizagem de verdade? Talvez tenham morrido durante a Ditadura.

Passamos dias tão tristes. Se a alienação presente for fruto do passado, isso comprova que, realmente, José Dirceu estava errado. Que futuro viveremos? Complicado.

A administração só reduz os nosso sonhos, poda sem piedade as garantias prometidas na graduação. Não tomamos nenhum cuidado com as mentiras, todas soltas como pássaros livres de razão. As promessas não são cumpridas pelos velhos coronéis. O período de aprendizagem se torna um mercado livre, um comércio de cursos que as instituições confessam terem fins lucrativos. Mas, de quem é a culpa? De todos. É falta de leitura, é falta de vontade. É falta pela busca de coisas novas, de referências que auxiliem, mesmo que a utopia esteja presente em certos artigos. Só não deixem os conteúdos românticos do passado inundarem com covardia a batalha que foi travada na Ditadura Militar. Não permitam que a poesia continue sozinha acumulando a poeira que esconde a beleza do viver.

terça-feira, setembro 23, 2008


Eu deixo você entrar
Desde que acompanhada
Do artigo que chamamos amar.

Não precisamos de muito além
Certas coisas, encontramos por aí
Um pedaço de pão, um álcool lá
Uma cigarrilha outrora
Embora eu perceba acolá
Já que a tosse chega bem
Mas levamos conforme vem.

Os dias podem ser iguais
Bastam aos olhos os seus presentes
Sei que não pedimos muito
O resto o imposto já levou
Tenhamos um pouco de ausentes
Afinal queremos a solidão
Somente para que os períodos
Venham mais carentes
Então possamos matá-los
Com aquele gosto forte
Que encontramos no avante norte.

Não precisamos de muito quem
O nosso qual é o suficiente
Aliás, sempre com
Seguimos mais constante.
Não duvidamos dos poréns
Eles pairam no dia-a-dia
Todavia diluídos vão
Desde que tenham a nossa companhia.


Leonardo Handa - 23 de setembro, 2008 - inverno

sexta-feira, setembro 19, 2008

poema rápido

uma pequena alegria me abriu o sorriso
atmosférico rir não constrangido
dedilhei um toque por dizer
percebi que não foi interrompido.
seus olhos abstratos perceberam
retornaram em um piscar estremecido
aos poucos de fato entenderam
liberei outro verso acontecido.

leveza em pálida constante anoitecer
o céu percebi que fosse padecer
mas não era hora de despedir
sua mão envolveu a minha outra
não tive como enaltecer
Retribui um ávido encostar
sentido na pele revelada
um som lindo de acompanhar
entreguei a sinceridade

quarta-feira, setembro 17, 2008

Amálgama


Uma linda canção arrastada transformou o seu holograma em matéria, em tátil, em massa. Ainda com os olhos fechados eu procurava enxergar com as mãos, somente para descobrir cada intimidade da sua pele. A música chegou ao final. Aquela mesma e manjada nota derradeira fez tanto sentido na profundida castanha dos seus cabelos que, de fato, não vi. Após abertos, percebi como o tempo e o destino revelaram tardiamente a sua presença, "que entrou pelos sete buracos da minha cabeça", como cantou Caetano. Afinal, o baiano é a nossa satisfação sonora dividida e contemplada. Mesmo assim, me pergunto: - Por que só agora? Tínhamos de ter tido outra oportunidade. Se fosse um ano antes, o diferente se faria presente, as angústias seriam açúcar, os dizeres, coloridos, e os beijos, não clandestinos. Mas, como "os infernos são os outros", basta continuar com os olhos fechados.

Meia-luz, meia taça, meio vinho, meio assim. Meio abraço. Metades. Sejamos. O meu grito foi de fúria. Fúria de viver. Fúria de gostar. Fúria de azar. Fúria de natureza. Fúria de final. Fúria de fazer. O seu foi de desespero, de lamento, de tristeza, de pesar. Juntemos, então, cada qual em uma outra canção com apenas três notas dedilhadas que imprimiu o sentir das coisas ali expostas. Uma delicadeza noturna que os amantes da razão entendem com perfeccionismo salutar. Eu queria ter citado outro poema, mas esqueci os versos. De toda a forma, imprimiu na boca a sede metafórica das delícias sobrescritas em meu peito. Se todos os dias fossem assim, eu seria o rei de mim. Portanto, sigamos. O caminho aberto das possíveis adjacências, os textos intermináveis sobre o fel, o mel, o céu. A cicatriz descoberta e marcada em um Dia de Independência da nossa nobre nação. A dobra revelada quando caído o pano apresentou. Um sono em seu ombro, agora, continuou no meu sonho. Prometo sempre estar em sua confusão, mesmo que seja a última, a vice-campeã, a prata, o bronze e o amálgama.

quinta-feira, setembro 11, 2008

Oi, Leozinho! Escrevi esse texto pra falar um pouco do que já falamos, do que eu leio de você no que você escreve e de certo modo para celebrar nossa amizade literária. Um Feliz aniversário, atrasadíssimo, mas cheio de lembranças de muitos momentos marcantes e da certeza de que vamos ser sempre amigos!!! Um super beijo, Adri.
Segue o texto:
Eu ia cantar um mantra, um dia
Pra realizar aquela sua fantasia
Você lembra?

Tanta coisa na vida eu deixo assim
Livre das urgências, longe de emergências
Sou uma antítese da pressa
Escuto e sussurro coisas
Faço dias dos fragmentos de tempo
Como quem monta um quebra-cabeça

Eu vivo num jogo de paciência

Mas fala comigo a tua letra avessa
Meu ritmo cardíaco errante
Entende o compasso do teu verbo
E essa tua percussão tão precisa

Eu falo quase na quietude da simplicidade
Sobre a tua complexidade berrante
Espero que a conversa sempre avance

De um lado, que a tua pressa grite
Poderosa, adjetiva, exagerada
Vivamente escrita

Enquanto por aqui
Vou escrevendo
Como quem canta
O Mantra.

sexta-feira, setembro 05, 2008


Deitado. Ben Folds Five na vitrola. O pensamento corre livre no dedilhar do piano. Narcolepsy. A voz massageia os tímpanos. Algumas imagens se formam. Um campo verde e apenas uma árvore solitária na paisagem. Um céu com poucas nuvens cinzas aparecem. O vento balança as folhas. Uma se joga em queda livre encontrando o chão. Os olhos se abrem. Observo a luz vermelha. Um aviso pessoal grita: dez minutos. Não levantado.

As canções continuam a me fazer companhia, a mais fiel, a mais perfeita, a mais deliciosa, a mais voraz. Sempre fico nervoso antes de enfrentar o público. Mesmo com os anos de experiência, entreter o eleitorado me dá gelo no estomâgo. Acendo um cigarro, olho o roteiro. Hoje vai ter palhaço, leão e picadeiro. Panis et Circense. Sem motivo, relembro aquele discurso do Caetano em um festival quando ele foi vaiado no momento que cantava palavras de ordem. Como eu gostaria de estar lá. Não para engrossar o caldo do coro dos descontentes, mas para vivenciar um período tão importante na história da música brasileira. As vaias me chamam a atenção. Até João Gilberto recebeu. Então, a gente pensa: como é difícil o público do país. Alguns são tão contraditórios que arrepiam a espinha.

10 segundos. Subo no palco, minha alma cheira talco, parafraseando a canção do Gil, e desejo uma boa noite. E boa sorte. Para a minha pessoa. Claro. Apresento as atrações da noite, faço minhas micagens, um tanto sem graça, observo os minutos passarem, vejo os comerciais passarem, analiso o público e encerro. Pelo corredor, retornando ao camarim, lembro daquela imagem que eu estava formando anteriormente. A árvore continua lá, solitária, mas agora as nuvens estão em companhia de outras mais escuras. Uma chuva inicia. Acendo outro cigarro. Fico viajando. O pensamento livre novamente. Encontro o sofá. Ligo o som. Ben Folds Five. Desligo-me do mundo. Nada faz sentido. Uma outra folha cai da árvore. Molhada. Como o desespero dos meus olhos que agora vazam a insatisfação. Tudo bem, sou apenas um personagem. Não sou feito de razão, sou feito de letras e bytes. Porém, demonstro uma situação.

terça-feira, setembro 02, 2008

Quero mais rápido do que preparar um Nissin Miojo

Eu quero a urgência de uma das canções do Doolittle. Qualquer uma do álbum. The Pixies sempre me trouxe alívio. Eu quero ser afoito neste momento de armageddon. Quero explodir em um momento único. Quero o imediato. Quero mais rápido do que preparar um Nissin Miojo. Quero cru, quero vivo, quero só. Eu quero o artificial dos lábios da Pamela Anderson, quero as almofadas de falar da Angelina Jolie. Quero dormir com você e acordar com a Cat Power. Eu quero um grito no vácuo. Eu quero um surdo no berro. Eu quero a alma em migalhas. Eu quero o coração do pássaro mais raro, do felino mais extinto, da pedra preciosa não descoberta. Eu quero a sua melhor canção não composta. Eu quero a calma em raiva. Eu quero um beijo roubado. Eu quero um acorde quebrado. "O mundo é pequeno pra caramba, tem alemão, italiano, italiana... O mundo é uma salada russa, tem nego da Pérsia, tem nego da Prussia". Eu quero o desespero. Tudo bem, eu não espero, por isso quero agora, quero embora, quero porém, quero contudo, quero senão. Quero todos os poréns, as todavias. Eu quero o plural e o singular. Eu quero presença, eu quero a tua no meu, a minha no teu. Eu quero o arrependimento, o alimento, o sortimento, o fomento. Eu quero outra vez compor um poema igual ao já musicado. Não se lembra, então, eu relembro:
"Carregue daqui os meus sonhos, leve-me junto também/ Disarme os meus planos, leve-me muito mais além/ Desfaça o que eu fiz, eu ando na beira por um triz/ Coloco em risco a vida, mas quero me ver feliz/ Por isso, me tire daqui/ Faça Por isso, me tire daqui/ Cole a minha foto em sua lembrança/ Rasgue o pessimismo que eu fiz/ Só não me deixe mais aqui/ Faça-me, quando preciso/ Mas deixe-me cair na vodca como alívio./ Você sabe que eu complico/ Mesmo assim eu suplico/ Eu sei que tenho chance/ Pois você está ao meu alcance/ Ajuda-me a descolar o sofrimento/ Traga novamente o sortimento/ Tudo isso eu quero, porque eu te amo/ Exalo fumaça quando eu te vejo/ Traga os meus pensamentos até você./ E quando eu choro é porque eu sofro/ Reconstrua o meu desejo/ E desfaça o meu sorriso".
Eu quero a urgência do desespero...
Citação: "O Mundo" - Paulinho Moska

Samba de Emoção

Vai, coração.
Exploda no último acorde
Bem no fim da canção.
Jogue da artéria a última gota
O derradeiro sentimento
O caos do ressentimento
A primeira emoção.

Uma nota dissonante
Uma vida errante
Um cemitério de elefantes
Uma antologia de escritos
Um álbum não ouvido
Um amor não vivido.

Vai, coração.
Entre em auto-combustão
No próximo solo
Regado a alcatrão.
Deixe a fumaça vazar da aorta
Ficando aos poucos morta
Em uma partitura outrora.

Em um beijo perdido
Em um olho de vidro
Em um castelo de pó
Em um desejo aberto
Em um brinquedo de Lego
Em um sorriso de plástico
Em um Cristo de nó
Em um poema fechado
Em uma clave de sol.

Vai, coração.
Perceba o sustenido
Com um descalibrado ouvido
Que não sintoniza o sim
Só justifica o não
No dedilhar moribundo
De um belo e triste
Samba de emoção.