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Mostrando postagens de novembro, 2020
  Hoje lembrei, ao acordar, de escrever uma carta. Coloquei a água para ferver e preparei o meu café. Lembrei das noites mal dormidas, dos dias sofridos. Dos cigarros derrubados no chão, do cinzeiro transbordando. O sol perfurou a janela e o raio entrou sem pedir licença. Não sou observador, confesso, muito menos sentimental, Mas a cena me pareceu um sinal. Lembrei você. Iniciei os agradecimentos, os olás, o tudo bem. A fumaça do café se misturava com a do cigarro. Contei um pouco da rotina que ainda acabará me matando, Dos estranhos que acabo entregando intimidades, Da moça da panificadora, do chuveiro estragado, Ainda tenho que arrumá-lo. Tenho preguiça. E do roteiro que ainda insisto em não terminar. Percebi que faz um ano. Como foi estranho. O seu perfume adocicado já não mais está presente, Seus discos de new wave eu já doei, O anel, penhorei. Não quero apavorar a sua paciência No entanto, ainda recebo as suas revistas femininas. Se possível, cancele a assinatura. Se não me qu...

iPod

  Uma canção de beijos desesperados rola no iPod. Meia luz escura no apartamento. Ela, deitada no sofá, olha a foto mais feliz: lábios em contato acompanhando a canção. A água ameaça pingar pela torneira da cozinha, mas o que desliza é a mão pelo rosto. O cantor da música dá razão aos sentimentos da moça. O tom aumenta e um falsete desesperado rasga o tímpano sofrido. O olho não segura e permite um deslize. A lágrima encontra a almofada, que já está molhada desde o verão passado. A sequência de acordes termina e ela volta ao zero, coloca no repeat e se deixa envolver pela atmosfera subversivamente caótica da canção. Levanta-se como quem quisesse se deitar novamente, lança um olhar de desprezo na foto e grita ao primeiro corte. A canção está tocando pela terceira vez. Os joelhos encontram o chão e uma surdez mórbida invade por alguns segundos. Ela sente deliciosamente o que pensou ser uma lâmina. O objeto fica encaixado enquanto o fluído ameaça escorrer. Desliza. Lisa. Desfaz. Delíc...
  _Nada demais em pensamentos outrora. A viagem acabou, o dinheiro também, e o sexo não foi bom. O pessoal se mandou. A sala está bagunçada, o disco está riscado. A faixa que pula é aquela que você não gosta. O disco? Aquele que você detesta. O sol está surgindo. As preces, continuam. O embargo da voz engole a derrota, o choro, o fracasso. Mas o dia vem e apesar do tsunami nessa casa, a esperança enche novamente esse copo de vodca. Nada melhor do que a coragem líquida para embalar a situação. _Um cigarro está aceso, alguém saiu de fino. O fino eu acendo. A viagem retorna, o dinheiro transborda e o sexo volta a ser bom. O pessoal retorna. A sala está cheia, o disco toca normalmente. A faixa é aquela que você gosta. O disco? Aquele do Traveling Wilburys. O sol se despede. As preces, esquecidas. A voz vira grito e a derrota é bebida, o choro, vomitado, e o fracasso, foda-se. O tsunami abençoa os seus quadris, a esperança fica linda nesse copo de vodca. Nada melhor do que prosseguir co...
  O tal conceito de burocracia é amplo (o que é uma merda), mas se caracteriza por um sistema hierárquico que, dizem, é repleto de divisão de responsabilidade. Também pode ser lembrado como uma administração cheia de divisões e regras, sobretudo. Ou seja, resumidamente grotesco: totalmente desnecessária ao funcionamento de um sistema. Ardem-me os olhos quando algo tão simples precise ser analisado por um conjunto de habilidades que, por fim, quase se tornam dogmas que todos reclamam, porém, quando ali vividas e inseridas, fazem delas aliadas. Balzac, em sua sã-loucura, vomitou que a burocracia é um sistema gigantesco gerido por pigmeus. Melhor tradução não há caso a frase seja degustada no sentido pejorativo, sem qualquer descriminação aos pigmeus, mas sim, às pessoas de pensamento pequeno. É lamentável, ainda mais em redes sociais, quando se menciona ou se lembra de algo semelhante. Apesar de necessário o bom senso, a audácia e a criatividade não devem ser mal-tratadas por causa d...