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Marginal


Meu cinzeiro está cheio até a borda. Cada cinza ali jogada é uma lembrança assassinada. O período é de reciclagem mental, limpeza a mais para armazenar outras memórias. Tantas outras já foram perdidas em copos de café com vodca. Somente os períodos felizes ficaram gravados, todos bem registrados ao som de Devendra Banhart, como se fossem um filme em pré-produção.
Aos poucos um novo roteiro surge, com fúria, música, sujeira e prosa, repleto de grotescos erros gramaticais. Por vezes a dicção também se perde, surgindo sons interessantes de pura irresponsabilidade. Novamente o lado marginal brota das entranhas um licor de saudades. Eu sei muito bem que a sua presença não quer bebê-lo. Eu insisto. Você aceita.
A noite invade o recinto vazio do meu quarto. A janela ainda está aberta. Acesso fácil aos insetos que se sentem atraídos pela luz estrambótica. Somente os distraídos caem na armadilha traiçoeira do intento. A artimanha planejada conquista o eleitorado. Não demoro e destilo o veneno guardado em meus dentes. Meu ferrão artificial é a arma menos mortal. Ainda tenhos nas palavras o mortífero golpe de piedade. Como é doce a sensação do vencer, do conquistar, do estraçalhar.
O tempo passa e todos os atos vão se transformando em cinzas. Todas acumuladas devidamente no cinzeiro, até que ele fique cheio, quase derramando pela borda. Após, as lembranças são jogadas pelo ralo. E volta o círculo vicioso hiperbólico, redundante e presunçoso. É pura maldade e marginalidade. Assim o sorriso se abre na boca rachada de pura malícia.

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Fim

  É tanto vazio nesse espaço cheio É tanto desamor nesse amor É tanta sofrência nessa alegria É tanta felicidade nessa tristeza É tanto amigo nessa solidão É tanta falsidade nessa realidade É tanta falta nessa plenitude É tanto concreto nesse verde É tanta abstinência nessa bebida É tanto início nesse fim.

Oportuno

Os dias frenéticos me interropem os prazeres. Os pequenos detalhes seguem despercebidos, Nem a velha canção funciona e não emociona. As horas estão lotadas neste pensamento aflito. Eu procuro um grito, mas o perco no vácuo. Faço do coração apenas um pulso de sangue E não vejo que de fato ele quer uma percepção. Eu passo um risco no instante que quero. Preciso de calma mesmo querendo o agito. Fico aos nervos quando necessito de paz. Recorro à memória e me sinto traindo. Nos segundos falecidos eu vejo a derrota E amplio com dicotomia, pois não é a verdade. Trato o acaso como um passado empoeirado E reflito neste pouco que nada está atrasado. Tudo se trata de período contido Que poderá ser resgatado em um dia oportuno.
Alguém me disse que uma das melhores coisas para se esquecer um amor é escrevendo sobre ele, analisando os fatos. Não sei dizer se isso é verdade, mas sei que dói. Tenho quase 30 anos e já tive desilusões amorosas e confesso: as outras foram mais fáceis. Certa vez um amigo comentou que só existe um grande amor na vida. E eu passei a acreditar nisso. Muitos profissionais dessa área, afinal, praticar o amor é viver em sofrimento e dedicação trabalhista, procuram no bar mais próximo o método para esquecer o momento do rompimento. Eu não tive essa oportunidade, pois o bar mais próximo era muito, mas muito longe. O detalhe é que o rompimento aconteceu na casa da pessoa que até então se declarava, que dizia: depois de tudo o que passamos, terminarmos seria um erro. Puta merda! Tem ideia de como me sinto quando lembro dessa frase? Quando isso acontece, logo me vem à cabeça os bens materiais. Por que gastei? Para que comprar um perfume tão caro? Para reconquistar? Sim, e olha no que deu. E a c...