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Bateu a saudade

Bateu uma saudade de não fazer nada. Aquela em que eu ficava olhando para o céu deitado no telhado. A noite sempre foi a minha melhor companhia. Bateu uma saudade quando você aparecia, do nada, do além, do sem avisar. Essas surpresas eram as melhores. Hoje em dia ninguém faz isso. Às vezes nublado se tornava, mas logo vinha o vento e jogava as nuvens em outras direções. Direções muitas que um dia tentamos seguir, mas opostos foram os caminhos.
Bateu uma saudade enorme das conversas, dos diálogos, dos prólogos e das teses. O mundo parecia conspirar quando menos analisávamos. As batalhas de frases eram incríveis. Até o Tarantino ficaria orgulhoso. Bateu simplesmente uma saudade de uma época que era única. Um período de preocupações incansáveis, de angústias incontroláveis, de momentos inexplicavéis, de sofrimentos mensuráveis. Bateu uma saudade da voz falando calmamente sobre sonhos de viajar pela América Latina. De conhecer a Patagônia, de viajar para a Colômbia, de explorar Santiago. A vida pede provas e quem ama dá, já tinha dito o compositor que você sempre citava e cantava. E naqueles momentos elas existiam. A conseqüência final foi o sentimento.
Bateu uma saudade. Abri um livro e caiu um poema. O amarelo já tinha tomado a página. Mesmo assim dava para ler. O texto falava justamente das lembranças, das boas saudades. Recordei o dia em que você o escreveu. Vinho na mesa, velas acesas, Chet Baker na vitrola. Um pedaço de sulfite, uma caneta Bic, uma inspiração. A noite quente entrando pela janela, a brisa do mar batendo no vidro e um cachorro latindo. A primeira frase veio em segundos, a segunda em seguida. A terceira arrebentou meus olhos e a quarta, o coração. Um cigarro foi acendido, mais um gole acrescido e uma mariposa se batia no abajur. A quinta frase veio mal pensada, recompensada pela seguinte, que falava sobre palpite. Um sorriso surgiu na seqüência, retribui com um piscar, o relógio marcou 3 horas e o Chet solava rompimento. Um criança apareceu na sétima. Os olhos se encheram de lágrimas, uma delas caiu na oitava, até hoje borrada. A nona rimou com dor e a décima feriu a infância. Mas na décima primeira o sol apareceu, na outra se pôs, na décima terceira amanheceu lindo e na última acabou a poesia. E agora bateu a saudade.

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um gole de derrota nesse asco. um casco entre as unhas, colabora. o copo quebrado acumula pó e o nó na garganta é charme. a calma quer explodir em caos para um fundo em furo se enfurecer na poética dissonante de um crescente anoitecer. mencionado antes, agora exposto "o mundo está duas doses abaixo" por mais que às vezes, acima, recria o oposto da colocação. então, não tenha medo hora ou cedo o coração padece e merece um aproveitar que tenha como fim o sorrir. (mas não acontece).

Fim

  É tanto vazio nesse espaço cheio É tanto desamor nesse amor É tanta sofrência nessa alegria É tanta felicidade nessa tristeza É tanto amigo nessa solidão É tanta falsidade nessa realidade É tanta falta nessa plenitude É tanto concreto nesse verde É tanta abstinência nessa bebida É tanto início nesse fim.

Oportuno

Os dias frenéticos me interropem os prazeres. Os pequenos detalhes seguem despercebidos, Nem a velha canção funciona e não emociona. As horas estão lotadas neste pensamento aflito. Eu procuro um grito, mas o perco no vácuo. Faço do coração apenas um pulso de sangue E não vejo que de fato ele quer uma percepção. Eu passo um risco no instante que quero. Preciso de calma mesmo querendo o agito. Fico aos nervos quando necessito de paz. Recorro à memória e me sinto traindo. Nos segundos falecidos eu vejo a derrota E amplio com dicotomia, pois não é a verdade. Trato o acaso como um passado empoeirado E reflito neste pouco que nada está atrasado. Tudo se trata de período contido Que poderá ser resgatado em um dia oportuno.