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Devaneio

Cabe-me ao contrário o disposto gosto do ameno. Traga-me a alegria inglória do passado que eu esqueci. Seja sincero, camarada. Seja o acaso do reencontro involuntário naquelas manhãs de conversas arquitetadas pela adolescência vivida. Às vezes o atroz batia na porta, mas sempre tínhamos uma maneira de fingir que não estávamos. É uma tristeza saber que a distância separa uma amizade legal, que foi degustada com sagacidade e gratidão. Afinal, quando um pedia auxilio, sempre estávamos no mesmo lugar. E agora? O momento está difícil no seu lado e não posso abrigar os seus dissabores.
Ainda há cumplicidade, pode ter certeza. Torço por você na turbulenta vida que você assumiu, regada aos cuidados fraternos e ao alcoolismo exacerbado por sentimentos paternos, engolidos todo santo dia de religião. Não há nada que eu possa fazer, apenas pensar no seu melhor.

***

Lembra daquelas caminhadas noturnas em companhia do vento gelado e daquela garota linda que parecia uma boneca de porcelana? Como era sensacional as angustiantes prosas que inventávamos, ao sabor do vinho vagabundo que sempre vomitávamos. Relatando assim, parece azedume, porém, era amizade. Não lembro como éramos conhecidos, Los tres? O interior nunca mais foi o mesmo depois das nossas partidas. Cada qual em seu canto, cada qual tentando a sobrevivência, cada qual em uma área, cada qual se reinventando. Por vezes, quase sempre, assim mesmo, dicotômico, o saudosismo atravessa a via de tráfego do pensamento. Quase sempre um sorriso se manifesta. Aliás, quero aquelas fotos das madrugadas de devaneios. E eu que era tão apaixonado. E você que era tão caco. E ela que era tão falante, com as suas duas almofadas labiais que encantavam até os pederastas. Foram tantos momentos que ainda hoje são eternos na lembrança mais embriagada. Cara, demais.

***

Fique com a sorte e com o azar. Só não se esqueça de mandar notícias, meu amigo. O que eu puder fazer, eu farei. Ainda tenho a fita dos momentos que ficaram, lembra. A boneca de porcelana fez uma cópia e levou junto à ela, quando me despedi das gratas presenças que ela nos realizou. Se cuide.

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um gole de derrota nesse asco. um casco entre as unhas, colabora. o copo quebrado acumula pó e o nó na garganta é charme. a calma quer explodir em caos para um fundo em furo se enfurecer na poética dissonante de um crescente anoitecer. mencionado antes, agora exposto "o mundo está duas doses abaixo" por mais que às vezes, acima, recria o oposto da colocação. então, não tenha medo hora ou cedo o coração padece e merece um aproveitar que tenha como fim o sorrir. (mas não acontece).

Fim

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Oportuno

Os dias frenéticos me interropem os prazeres. Os pequenos detalhes seguem despercebidos, Nem a velha canção funciona e não emociona. As horas estão lotadas neste pensamento aflito. Eu procuro um grito, mas o perco no vácuo. Faço do coração apenas um pulso de sangue E não vejo que de fato ele quer uma percepção. Eu passo um risco no instante que quero. Preciso de calma mesmo querendo o agito. Fico aos nervos quando necessito de paz. Recorro à memória e me sinto traindo. Nos segundos falecidos eu vejo a derrota E amplio com dicotomia, pois não é a verdade. Trato o acaso como um passado empoeirado E reflito neste pouco que nada está atrasado. Tudo se trata de período contido Que poderá ser resgatado em um dia oportuno.