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Existe Uma Luz Que Nunca Sai


Ele está se perdendo, não alcança mais a satisfação de outrora. O tempo foi o seu rival predileto, hoje se tornou amigo de confidências. Desmorona memórias de um passado repleto de vitórias, ouve os seus discos prediletos retirados de uma estante de lembranças e derrama lágrimas de pó com ácaros e bactérias. Não entende o futuro, mas continua a acreditar no presente, mesmo que ausente estejam as suas virtudes transparentes.

Certo dia, quando passeava perto do Jardim das Américas, pensou estar tendo um deja vú, porém, se tratava de uma visão real. A cena de um cachorro brincando com uma criança que, por sua vez, ao correr para o outro lado da rua foi atropelada, remeteu-o à infância que degustou com primor. O rapaz lembrou do período no hospital, no gesso do braço, no hematoma da perna e na cicatriz que até hoje carrega no canto do rosto. Lembrou como tinha sido infeliz a sua mãe junto ao seu pai e como um acidente banal aproximou-os. Era década de 1980 e, mesmo aos sete anos, o álbum predileto se chamava "The Queen Is Dead", do Smiths. "Balão Mágico" e "Trem da Alegria" eram cócegas fraternais para os seus ouvidos.

A tal cena do acidente foi um canal que trouxe, resumidamente, a retrospectiva da sua vida, sem direito a narração em off nem efeitos sonoros. O único som que serviu como trilha foi "Bigmouth Strikes Again", por mais que a sua preferida fosse "There is a Light That Never Goes Out" (Existe Uma Luz Que Nunca Sai). Até hoje, os versos do refrão são os seus preferidos, simples, mas que remetem fortes significados: "E se um ônibus de duplo-andar colidir conosco, morrer ao seu lado é tal como uma maneira maravilhosa de morrer/ E se um caminhão de dez toneladas nos matar, morrer ao seu lado, bem, é um prazer, o privilégio é meu".

Mas o fato é que ninguém nunca morreu de amores por ele. Ele, com certeza, morreria, pois quando atropelado, na realidade, ele estava salvando o seu cachorro da morte. Quebrou um braço, mas salvou o amigo, talvez o único da infância. Hoje ele vive de passados.



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Oportuno

Os dias frenéticos me interropem os prazeres. Os pequenos detalhes seguem despercebidos, Nem a velha canção funciona e não emociona. As horas estão lotadas neste pensamento aflito. Eu procuro um grito, mas o perco no vácuo. Faço do coração apenas um pulso de sangue E não vejo que de fato ele quer uma percepção. Eu passo um risco no instante que quero. Preciso de calma mesmo querendo o agito. Fico aos nervos quando necessito de paz. Recorro à memória e me sinto traindo. Nos segundos falecidos eu vejo a derrota E amplio com dicotomia, pois não é a verdade. Trato o acaso como um passado empoeirado E reflito neste pouco que nada está atrasado. Tudo se trata de período contido Que poderá ser resgatado em um dia oportuno.
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