Meu nome é Leonardo Silveira Handa. Jornalista. Perdido. Achado. Amante. Radialista.

sexta-feira, agosto 09, 2019

Entenda beleza, eu ainda prefiro o conteúdo. Sua graça me distrai, mas procuro manter a calma. Confesso que já me perdi em seu torso nu. Na sua pele morena. Nos seus cabelos escuros e nos seus olhos castanhos. São tão invencíveis, pedaços sublimes de pecado exacerbado. Em você, eu me perco, reviro o acaso, me torno poeta. Em você, me transformo em plebeu, obedeço os critérios, pratico adultério e procuro um consubstancial. Porém, entenda, ainda primo pelo teor.

Já solicitei tantas vezes, quase nunca fui ouvido. Não adianta, você sempre consegue me seduzir. Eu sou fraco, eu sou carne, eu sou ser, abstrato, confuso, continuado. Quando adentro, fico idiota, caricato: estereótipo de capa de revista. Então, como não aguento, eu me entrego. Mas ainda falta o conteúdo. Portanto, entenda beleza, você está me fazendo perder os valores. Fazia tempo que eu não me entregava em uma batalha. Você continua ganhando. Todas. Estou jogando meus princípios no vaso sanitário, nos tocos de cigarros, nas taças de vinho, no vidro empoeirado, no branco que escurece, na vontade que prevalece. Eu fico tonto. Eu fico torto. Eu fico bobo.

Não vejo razão, Nick Cave não me dá opções. E você nem conhece. Para quê? Não necessita, basta uma Vogue. E, aos poucos, vou me entregando, abrindo as pernas, recebendo o putrefato pela boca, dentes e garganta. Vou engolindo o seu mundo, as suas frivolidades. Quer saber? Nem queire. Já perdi. No entanto, por favor, ao menos procure algo do Cat Stevens, não precisa descobrir a sua biografia, apenas ouça Wild World. Não estou pedindo muito, não estou pedindo que conheça a poesia do Buarque, somente demonstre um pouco de interesse. É muito egoísmo, eu sei. Isso não combina com o seu Dolce & Gabbana. Disparidade. Tudo bem, apenas entenda, beleza, você me corrompe o conteúdo.

quinta-feira, agosto 08, 2019

Pense que ainda existe amor.
Está na esquina, no copo do bar.
Ali embaixo do nariz, 
Do chafariz.
Nos deslizes da mão do jogador.
Pense que ainda há.
Permanece em Bagdá
No coração do homem bomba
No olhar das pessoas de lá.

Pense que ainda existe amor
No carro que só pega no tranco
Em sua pele morena do sol
Nas ruas de Pato Branco.

Pense que ainda existe
Consiste em observar
Perto daqui, longe do mar.
Na hora de se abraçar.
lsH.
Negras, belas
Em tabelas
De contas
A massagear:
Olhares, egos,
Nos mais
Lindos passeares.
Em lares, bares,
Cidades,
Com saias
Floridas
De pétalas norteadas
De puro
Encanto
Em todos os cantos
Que os prantos
Ousam parar
Só para vê-las
Elegantes e galantes
A cantar.
lsH

segunda-feira, agosto 05, 2019

Meu coração 
É gelo
Que berra
de tédio
Sem você
Como elo.

Minha aflição
Não é farsa
Quando em
Seu abraço
eu me encerro. 

sexta-feira, agosto 02, 2019

Uma outra noite de fé sem sono. A companhia dessa vez é o café, a fumaça e The Editors. A referência joydivisiana ecoa, tanto nas linhas de guitarra como no vocal quase chorado. Ela pouco conhece a banda, apenas sabe que lhe faz bem. A canção que mais entoa no ouvido é Lights. Apesar do título, quase nada a ilumina. Somente a luz do poste e a brasa do cigarro.
A noite não foi de trabalho. Resolveu tirar folga de si mesma. Deitou em seu sofá, ligou o som e se deixou transportar pelo calor/frio das músicas. Acabara de baixar a bolachinha The Black Room, um título bem apropriado para o momento pelo qual estava passando. Acendeu uma bituca e viajou. O barulho infernal dos carros na rua não mais a incomodava. O fone de ouvido era muito bom. Importado. Gentileza de seu vizinho contrabandista.
Quando iniciou os primeiros acordes de Camera, ela se transportou imediatamente à infância. Se imaginou sendo balançada pelo seu pai, depois brincando com seu meio-irmão e logo após levando uma bronca de sua mãe. Chorou. Bebeu um gole de café e tragou suavemente. A canção continuou e outras lembranças acertaram o tímpano. Não teve como não recordar do Echo and The Bunnymen, sobretudo daquele show em São Paulo, quando ainda era adolescente.
A noite que era para ser de tranquilidade acabou remetendo ao saudosismo que escondia em um fundo bem fechado do cérebro. Alguns costumam chamar esse lugar de sub-consciente.
Mas o momento apoteótico chegou ao ouvir Bullets. Não teve dúvida, nem tempo. A adolescência era vivida de novo em linhas de pensamentos despedaçados. Fechou os olhos. Viu o primeiro beijo. A primeira transa. O segundo amor. O primeiro não tinha sido tão bom. Gozou no lençol. Derramou café. Esqueceu o cigarro. Olhou para a vela acesa no criado-mudo. Sonhou acordada. Finalmente conseguiu relaxar. E a fé do sono chegou. Rezou e dormiu. Tranquila. E gozada.