Meu nome é Leonardo Silveira Handa. Jornalista. Perdido. Achado. Amante. Radialista.

segunda-feira, outubro 30, 2006

Que pena


O calor está derretendo os tímpanos. Aos poucos, a surdez precisa do verão vai aparecendo na costumeira temperatura que incomoda. E isso assola os sentimentos. Infelizmente, como naquela canção, não tem como deixá-lo para mais tarde. Se uma praia se fizesse presente, aí sim, não precisaria atrasá-lo.

É muito suor em pouco empenho.

Mas, o lado bom são as costumeiras curvas que aparecem deliciosamente em retratos de cerveja. Ou seja, cerveja. Tanto faz, pode ser no bar da boa, na eterna e dolorida questão de não realizar os desejos ou no namoro com algum garoto propaganda, onde uma atriz sela o pacto da paixão. O certo é o calor causando furor na imperfeição bela da estação. "E ninguém dirá que é tarde demais, que é tão diferente assim, o nosso amor, a gente é quem sabe, pequena". A citação não se refere ao deixar o verão, ficamos então, para o último romance.

A temperatura encrava na pele um desgosto ambíguo, de felicidade e tristeza. Por vezes impera a moleza da pressão baixa que volta a subir quando chega a noite com a sua brisa morna. Dormir se torna um perene, um desafio, uma claustrofobia. Não há como embeber. Embebido pano com água gelada. Embebido coração em fiapos de carne ao molho de sangue de touro. Embebidos lábios de loiras geladas e plastificadas. Embebida solução cibernética de alento casual, seja lá o que isso queira dizer. O calor afeta o cérebro. O calor congela e trava o cérebro. É o desgosto ambíguo encravado na pele, mais precisamente, no couro cabeludo sem proteção devida.

"Se dessa vez, ela é senhora desse amor, pois vá embora, por favor/ E não demora pra essa dor, sangrar".

A surdez está terrível. A solução é criar um banco de sons na memória enquanto posso ouvir. Começo, então, por Los Hermanos.

Já que não posso deixar o verão para mais tarde. Que pena. Ou seria, pequena?

quinta-feira, outubro 26, 2006

Coragem

Coragem. Difícil em metáforas. Complicado nas derrotas. Grandioso em vitórias. Coragem. Terrível quando falta. Medíocre na facilidade. Detestável nas perdas. Coragem. Como falta coragem. Que corragem, o quê? PORRA.

Coragem no amor que desanda, coragem na guerra vencida e, também, perdida. Coragem na intenção de não assumir compromisso. Coragem de terminar algo iniciado.

Coragem...

terça-feira, outubro 17, 2006

Palavra bonita

Existem tantas pesquisas desnecessárias realizadas pelo mundo afora que muitas beiram o enfadonho. As perguntas também são tão idiotas quanto o assunto pesquisado. Distorcendo as frases em questão aqui apresentadas, certa vez, na Inglaterra, foi realizada uma pesquisa com os ingleses a respeito da palavra mais bonita do país. Os indivíduos daquele país elegeram "mother" como a vencedora. Na ocasião, mais de 40 mil pessoas foram entrevistadas.
De acordo com a pesquisa, além de "mother" (mãe), os súditos da rainha Elizabeth também apontaram "passion" (paixão), "smile" (sorriso), "love" (amor) e "eternity" (eternidade) como palavras bonitas. Curiosamente, "father" (pai) nem sequer foi mencionada. Ela deu lugar a outras mais peculiares, como "peekaboo" (esconde-esconde), "flabbergasted" (espantado) e "hen night" (despedida de solteiro, detalhe, somente para mulheres).
Aqui no Brasil, pelo menos até o que consta na pesquisa minusiosa realizada pelo Google, nenhuma pesquisa dessa espécie foi organizada. Até porque, poucos são os tupiniquins que realmente conhecem as palavras mais bonitas do próprio idioma. A certeza mais certa (desculpe a redundância) na indicação da TOP 10 seria B-U-N-D-A. Ou então, em épocas políticas, sanguessuga, vampiro, dossiê e "eu não sabia" seriam as que se destacassem. Tudo bem, o último exemplo é uma frase, mas, no atual contexto, poderia se encaixar como palavra.
De todas, na minha humilde opinião de jornalista perdido na selva dos profissionais descolados, acredito muito na sonoridade de "arquétipo". Esta palavra é tão composta, forte e sônica. Como é lindo ler em algum lugar coisas do tipo: "arquétipos de Jung", "arquétipos de Nietzsche", "arquétipos de uma mão de quatro dedos". Simples, claro, dissonante. E, para quem não sabe, arquétipo quer dizer: modelo, padrão.
Voltando à pesquisa inglesa, "mother" é um arquétipo. Quem não idolatra a sua mãe como um padrão inquestionável de saber, amor, paixão, sorriso e eternidade? Até as mães alcóolatras possuem as suas qualidades. O Lula saiu de uma mulher, com certeza. E, que por sua vez, é claro, era uma mulher. Se bem que alguns acham que ele é filho de uma jumenta. Mas isso é maldade demais. Antes um ser aquático do que um vegetal. Chuchu é um vegetal, né? Espero que sim. E, espero, que não seja um arquétipo. São Paulo já sofreu demais.

Leonardo Handa - jornalista

sábado, outubro 14, 2006

Nada muito além para colher no meio dos cactus. Por horas sobe um inseto que incomoda. Nada que um inseticida não resolva. O caminho das pedras está bem presente. Pobre dos pés descalços que sangram em passos lentos de esperteza. Arranca da cerne a última gota de esforço, enquanto desce o sol do último ponto de fuga visível a olho nú. O resto do corpo também desnuda. Paira em calma um agudo furo de reportagem não publicada. A época do bico calado nunca foi tão admirada. E retardado é aquele que ainda procura sentido no indelével questionamento persuasivo de mistério e poder. Os tempos são outros. O dinheiro também.Retorno ao encontro do santo recém batizado na Igreja Católica, no exato momento da cerimônia de lava-pés. O sangue da sola isola o ato de perdão. Sofre quem controla a população.

segunda-feira, outubro 09, 2006

A Carta de Pero Vaz de Caminha

Como são engraçadas algumas situações do cotidiano, sobretudo em momentos de definições políticas. O mais atual pilhérico em questão é a cobrança e reivindicação que os políticos solicitam aos outros políticos. Tudo em prol – é lógico – da população.
Os itens de exigências podem ser conferidos, pelo menos os da região Sudoeste do Paraná, através da Carta do Sudoeste e, recentemente, na Carta de Pato Branco. Aliás, essas “Cartas” têm se mostrado meios eficazes para apresentar os anseios da localidade, resumindo em um geral as pretensões do perímetro sudoestino. Ambas as propostas são parecidas e tentam mostrar a situação da região.
No caso da Carta do Sudoeste, o chamariz é o municipalismo e desenvolvimento regional, projeto desenvolvido pela Associação dos Municípios do Sudoeste do Paraná (Amsop). Se as situações estratosféricas de olhares sinuosos enxergassem melhor sem a costumeira miopia, não seria necessário desenvolver um artifício dessa espécie em favor da região. Óbvio que o Sudoeste é esquecido. Por muitos é considerada a mais pobre e desprovida região do Paraná. E olha que a terra produz 5,5% do Produto Interno Bruto paranaense. Mas, caso fosse vista com o real potencial que possui, a situação poderia ser mais favorável.
Qualquer setor da administração se preocupa com os detalhes para que o todo seja redondo; que o desenvolvimento seja alcançado de maneira sagaz. E são esses detalhes que ainda emperram os joguetes praticáveis. O Sudoeste não possui ramal ferroviário. As rodovias necessitam, urgentemente, de modernização estrutural. A Estrada do Colono se tornou uma novela tão melodramática que poderia servir de enredo a qualquer folhetim mexicano, com direito a par romântico a fim de chamar a atenção do eleitorado. A agricultura é tão forte que está causando problemas até nas ações das intempéries que, por puro ciúme, já prejudicou inúmeras colheitas. O produtor rural vai se perdendo nas indefinições do sol, da chuva, do vento e do granizo, além das costumeiras promessas políticas.
A Carta do Sudoeste está procurando salvar certas questões que aos poucos enfraquecem os municípios dessas plagas. Alguns ficam isolados como se fossem ilhas sem mar e sem água, já que a estiagem deste ano causou transtornos indeléveis. Ela também mostra como está a situação da região, como Pero Vaz de Caminha fez ao descrever os contornos e aspectos brasileiros ao Rei Manuel.
Em metáfora à Carta de Pero, os municípios do Sudoeste, aos poucos, realmente estão com as feições pardas, nem tão avermelhadas assim. Os rostos e narizes não estão bons no momento, mas hoje em dia existe cirurgia plástica. Alguns andam nus, por falta de verba. Nem mais fazem caso de encobrir suas vergonhas. “Acerca disso são de grande inocência”(?). Os cabelos estão corredios. Eles andam tosquiados, “de tosquia alta, mais que de sobre-pente, de boa grandura e rapados até por cima das orelhas”.
As situações do cotidiano continuam engraçadas, uma pena acontecer somente em momentos de definições políticas. Em todo caso, Pero Vaz de Caminha pode auxiliar.
Leonardo Handa - Jornalista

quinta-feira, outubro 05, 2006

Acertos Maus

Contato ausente
Em pele quente
Que arde dor
De passado beijo
Desfeito antes
Recriado oposto
Delicado gosto.

Mentira exposta
Na boca torta
De beleza oca
E fala morta
Que acabou
O amor incerto
De brigas boas,
Acertos maus
Vontades outras
Saudades poucas.

Ainda há bem
Outrora ruim
Um desejo em mim
De tragar o fim
Engolindo gim.

segunda-feira, outubro 02, 2006

Apenas sentia

Era de alegria que a face se abria em cinza. Era de sorriso que a boca sem dentes vazava a consideração. Era de felicidade que os olhos úmidos ameaçavam derrubar lágrimas.

A visão constante de desastre evaporava no momento que a notícia foi alvejada com tiros de prata e pólvora. Foi no seco que a bala engolida desceu. A ânsia veio em seguida, mas bastou um cálice de gasolina para o vômito não surgir.

Era de alívio que a morte apareceu com seu costumeiro ar de tranqüilidade. Difícil imaginar qual a real sensação de falecer, sobretudo quando um ferro penetra na carne ainda viva. Qual a dor? Pior que parto? Pior que transplante de rim? Pior que a perda de um amor ativo em pleno pôr-do-sol litorâneo... Ou melhor que rúcula com agrião ao molho tártaro de culinária equivocada?

As questões surgiram no exato e inoportuno doce de levar um tiro. Era de alegria, pois não precisaria mais dormir na lápide dura que ele chamava de calçada. Era sem dentes a boca cultivada a sobras, a lixo industrializado por seres muito mais limpos do que ele. E era de felicidade porque não agüentava mais ser escória de uma civilização que nada pôde e nada fez por ele. Era de rua que se vazia vivo. E foi de rua o tiro perdido por uma armada que apontava na cabeça de um empresário recém assaltado. A bala que tinha como endereço a cabeça do empresário, acabou na cabeça do mendigo.

Logo após, ele não questionou mais qual o tipo de dor que sentia. Apenas sentia.