Meu nome é Leonardo Silveira Handa. Jornalista. Perdido. Achado. Amante. Radialista.

quarta-feira, abril 30, 2008

Diálogo em cartas

Eu só queria a verdade. Algumas mentiras também poderiam servir, no caso. Desde que fossem interessantes. Mas não tive razões. As emoções escorreram pelo sujo vidro da pura vodca. Eu entreguei os sentimentos, esvaziei em tabaco, curti o desespero, vivi o escandalo. Procurei uma conselheira, uma cartomante. Nenhuma novidade me apontaram. A única ponta foi o escape, a salgada ilusão. Não entendo a outra, eu sempre quis ser a mesma. Não compreendi o beijo, mas o vi quando você estava no salão, mas um confete, na hora, caiu em meu olho. Traição de Carnaval, alguns não consideram. Eu considero.
Agora as lembranças estão lá na minha casa em uma caixa de sapato. A sua escova, o seu pente, a sua loção. A nossa música ainda embala o meu coração, mas estou dando um fim na situação. Pegue a sua intenção e meta no ralo. Minhas lágrimas já foram bebidas nas noites de neblina, não sobrou nenhuma para contar a lenda. Satisfação em conhecê-lo, em amá-lo, em odiá-lo. Minhas unhas, todas detonadas, há tempos não sabem o que é um esmalte. Tudo é culpa da marchinha carnavalesca e daquela odalisca que em sorrisos abriu os seus lábios. Que pena.
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Falhei, concordo. Dias horríveis sobrevivi. Cervejas inteiras derrubei. Lástimas turbulentas escrevi. Que besteira homérica realizei. Não culpo o Carnaval, culpo a oportunidade. Confesso, esperei uma solução. Um perdão. Agora em soluço encaro o vazio do meu lado, o seu cheiro no lençol, o seu perfume em minha camisa. Sofri, amor. Mas não tenho álibi. Seus olhos foram testemunha. Eu quis uma fúria. Culpa minha, toda. O sabor sentido foi dos lábios da odalisca em nada lembra o calor da sua mão. Meu peito aberto sangra a traição desesperada, mal pensada, penada. O sol brilha opaco. O vinho caro é saboreado barato. A sua foto na estante da sala está ainda mais bela. Desculpas não adiantam. Eu fiz, você viu. Corri atrás. Você partiu. Troquei desilusões. Meu cachorro, ao menos, me ouviu. Logo passo para pegar as lembranças. Pode ficar com o disco da Tori Amos, mas me deixe um pouco dos versos de Crucify. Eu entendo.

segunda-feira, abril 28, 2008


O modo de consumir música está mudando. Com o advento de programas e páginas de compartilhação pela internet, a maneira ilegal de se obter a canção do artista predileto facilitou de tal magnitude que está quebrando as grandes gravadoras. Há tempos a indústria fonográfica não se encontrava em uma crise tão sem volta. Departamentos de Marketing, assessores e empresários já não sabem mais o que fazer para tentar contornar a situação. A invenção do CD e, na seqüência, a criação da formatação MP3, decretou o fim do consumo musical como conhecíamos.

Nos dias atuais, ainda se vê lojas de discos que recebem os lançamentos do mercado. Mas, ao mesmo tempo que eles chegam às prateleiras, as canções já estão na internet. Pior, muitas vezes chegam antes no mundo on-line. O mundo físico está perdendo de goleada. Vários artistas do universo musical, se entregando à situação, mudaram a forma de comercializar os seus trabalhos. A independência artística tão almejada no passado, agora, é realidade. É claro que as grandes gravadoras ainda possuem o seu valor, porém, em processo de transformação se encontram.

O Radiohead, por exemplo, balançou o mercado fonográfico no ano passado. O grupo inglês vendeu milhões de discos com a ajuda de uma major, alcançando o sucesso comercial com The Bends, segundo álbum da banda. Thom Yorke, vocalista, guitarrista e mentor do Radiohead não pode ser considerado uma pessoa padrão. Em 2007, o cara decidiu que o mais recente trabalho seria lançado, primeiramente, na internet. Mas a grande sacada foi disponibilizar In Rainbows em um site próprio onde o interessado fazia o seu preço, ou seja, a pessoa escolhia quanto gostaria de pagar pelas músicas, de zero a 99 dólares. Dizem que muitos preferiram não pagar, porém, mesmo assim, a banda lucrou, já que a maioria baixou as canções por um valor de 5 a 10 dólares. O Radiohead, após fechar o site, lançou o disco em físico (CD) com algumas faixas bônus e, na Inglaterra, chegaram no topo dos mais vendidos. Tudo isso sem ajuda de uma grande gravadora.

No momento em que a banda anunciou a nova maneira de comercializar, vários acharam que a atitude era um verdadeiro tiro de 38 no pé. Contudo, o grupo provou o contrário, como em outras ocasiões quando ainda era do cast de uma gravadora. Em 1997, ao lançar Ok Computer, até hoje considerado o seu melhor trabalho, o Radiohead alcançou cifrões nunca antes imagináveis. O álbum alçou os ingleses ao patamar de melhor grupo de rock do planeta, apesar dos exageros. Assim, a banda deixou todos os fãs afoitos pelo próximo CD. Eles conseguiriam superar as expectativas? Particularmente, não, mas deixaram todos confusos com o lançamento do disco seguinte, Kid A, sucesso em vendas justamente por causa das especulações. Era o fim do Radiohead como todos conheciam, era o fim da época das guitarras e do lirismo. Surgiu, então, as programações eletrônicas e a utilização cada vez maior da voz de Thom como instrumento de som do que cantor de pérolas poéticas como "No Surprise" e "Karma Police". Portanto, o Radiohead sempre foi fora dos padrões. O fator surpresa é uma arma da banda, utilizada a favor da continuação de uma carreira que, por enquanto, não demostrou erros homéricos, mas deixou, devido ao lançamento de In Rainbows, a indústria fonográfica desesperada. Afinal, eles provaram que podem continuar o sucesso sem a dependência. Bastou ousadia. Algo que as grandes gravadoras ainda não possuem.

terça-feira, abril 22, 2008

Divagações escolares - Parte I


Que futuro é esse? Ainda ninguém alcança com as mãos, mas observam com os olhos e saboreiam com a língua. O finito é percebido, sobretudo, em dias de estiagem. Campanhas sempre alertam, mas a conscientização é rarefeita. Então fica a pergunta: estamos preparados para o pior?

O Brasil está em uma situação favorável quando se fala sobre o assunto. Nem é preciso salientar qual é o bem natural tratado. Não há entrelinhas. Está explícito. Enquanto isso, torneiras ficam abertas na escovação dos dentes, mangueiras sangram em desperdício nas calçadas, carros ganham desnecessárias lavagens de aparência e os colonos sofrem com a escassez. Se bem que as chuvas da última semana contribuíram um pouco na melhora da situação. As vacas e os pastos, ao menos, agradecem.

Engraçado também foi a inversão. O extremo da região sul tupiniquim há tempos não vivia uma seca tão cavalar. E o nordeste não via a hora da água parar de desabar. Mas agora os sertanejos rezam ao padrinho Cícero. O verde apareceu, as plantações estão vingando e os reservatórios se encontram quase derramando. A situação até será usada em alguma campanha política, como se fosse um alguém de cinco números que precisarão ser decorados ou estampados em uma camiseta que provocou a mudança climática. Praticamente um milagre da (re)produção.

Muito se fala sobre as transformações do tempo. Porém, pouco se sabe a respeito do futuro que realmente os seres vivos vão encontrar. A natureza está mostrando, em doses homeopáticas (ou seriam exageradas?), algumas pistas. Os estudiosos também. Resta saber se isto será motivo para uma guerra ou é apenas uma previsão do fim de uma era. Afinal, com tantos milhões de anos, a Terra já presenciou inúmeras mudanças climáticas. Sobreviveu a todas, contudo, com alarmantes modificações. Os dinossauros não conseguiram, por mais que eles se encontrassem em uma diferente situação. E bicho homem, prosseguirá?

Movimento rápido dos olhos

A imprecisão do colapso em um lapso de fúria. O sorriso imperfeito no escuro do sono. Um sonho em caos no furor do profundo. Um mundo inteiro devastado na alegria do momento. O passado não pensado no presente conseqüente. Revirando os olhos com movimentos rápidos. Acelerando em outro tempo. Automatizando para as pessoas. Reconstruindo fábulas, perdendo a religião. Um homem ligado à lua. Todo mundo chora, às vezes. Então, agüente. Do seu lado mais bonito, mande cartas de e-bow. Viaje na Lotus, anuncie um pranto. Espere no canto uma supernatureza superséria. Ou não seria isso? Um único ao amor.

sexta-feira, abril 18, 2008

Frêmitos


Caos em si com fruto mordido. Turbulência em estado sônico de palavras soltas em vão. Jogos de sentimentos em erosão em um terreno sem luar. Há elementos corrossivos no coração. Habeas corpus em solidão. Mais frases perdidas sem noção. Exercício de criatividade para alcançar o êxito sem o pleno entendimento do contexto. Um texto vago de absurdos claustrofóbicos. Figuras sem linguagem em concreto. Péssimas intenções musicadas sem inspiração. Sol negro sangrando em um cigarro constante. Vício poético de loucuras adjacentes. Sensações espasmódicas em alegrias estremecidas. Frêmitos.

quinta-feira, abril 17, 2008


Às vezes a sinceridade invade de tal maneira que distorce os fatos. Não é fácil ser compreendido. O dilúvio sentimentais interrompem o fluxo criativo, mas também aceleram, dependendo dos casos. Ainda bem que existe a música para controlar os altos e baixos. Mark Lanegan me dá a razão. A rouquidão sempre me fez bem.

Ontem estava com uma puta insônia. Olhei para meu velho companheiro, meu melhor amigo, o violão, e resolvemos compor algo. Como sempre, asneiras sônicas foram arquitetadas sem precisão. Nunca fui bom. Nem pretendo. Serve como terapia e nessas noites solitárias e azedas que ultimamente me visitam. Surgiu, portanto:


Um ato agora exposto

Televisivo mostra o rosto

E a fama registra alta

Um corpo liso em capa.


Um ensaio revela a baixa

O sorriso falso exalta

A reportagem maquiada abre

O segredo curto e grosso.


Retorna em pele e osso

Perde o mesmo fascínio

A atividade é mais efêmera

Quando existem os opostos.


Era para ser sobre uma famosa atriz, mas acabou em outro contexto. De toda a forma é um relato e não uma crítica. Quem dera.

quinta-feira, abril 10, 2008

Um resto, um pranto, um canto. Dois tocos, dois casos, dois fatos. Três socos, três vidas, três tiros. Quatro beijos, quatro furos, quatro atos. Cinco discos, cinco filmes, cinco livros. Seis cartas, seis seqüências, seis blefes. Sete de espada, sete de copas, sete de ouro. Oito tentativas, oito histórias, oito fotos. Nove canções, nove romances, nove poemas. Dez tiros, dez provas, dez envolvidos.

segunda-feira, abril 07, 2008

O Jantar

Entro no carro e sigo até a Br 227. Alcanço 100 km/h. 120 km/h. 140 km/h. 160 km/h. Percorro pelo breu sem pensar em nada, ao som de Cardigans. Escuto um barulho e tenho a leve impressão que o causador do estrondo fui eu. Mas antes vamos voltar 40 minutos.
21h46. A mesa repleta de amigos, Oswaldo Montenegro no 3 em 1 antigo de Isabel. Inicia "A Lista", uma das canções que mais tocam o meu coração. "Faça uma lista de grandes amigos / Quem você mais via há dez anos atrás / Quantos você ainda vê todo dia / Quantos você já não encontra mais". Isso causa dor de saudosismo quando ouço. E ele continua, sabiamente. "Faça uma lista dos sonhos que tinha / Quantos você desistiu de sonhar / Quantos amores jurados pra sempre / Quantos você conseguiu preservar". Chega nesta parte e já tenho vontade de fugir. Mas, Oswaldo ainda segue mais profético. "Onde você ainda se reconhece / Na foto passada ou no espelho de agora? / Hoje é do jeito que achou que seria? / Quantos amigos você jogou fora? / Quantos mistérios que você sondava / Quantos você conseguiu entender? / Quantos segredos você guardava / Hoje são bobos ninguém quer saber / Quantas mentiras você condenava / Quantas você teve que cometer? / Quantos defeitos sanados com o tempo / Eram o melhor que havia em você? / Quantas canções que você não cantava / Hoje assobia pra sobreviver / Quantas pessoas que você amava / Hoje acredita que amam você?". Péssima música para ser acompanhada em um jantar, é a única conclusão que tenho no momento.
Engulo um vinho seco caríssimo que não faz a menor diferença. Observo ao redor e todos estão felizes com as suas camisas Lacoste, vestidos básicos da Prada e relógios de marcas impronunciáveis. E o velho Oswaldo na vitrola. Quanta dicotomia.
Olho para a minha amada e linda esposa que não se cansa de falar do mais recente livro daquela autora iraniana. Ou seria americana que morou no Irã? Não importa. O fato é que metade das asneiras balbuciadas era da crítica feita pela revista Bravo. Mas ela, por vezes, falava com tal dignidade que pareciam dela as frases de efeito. Cheguei até a acreditar que a querida tinha resenhado o livro, tamanha convicção em suas palavras. Bocejei uma enorme mentira me fazendo de interessado. Logo, Isabel, movendo os talheres como se fossem as baquetas na mão do Iggor Cavalera, quebra a pauta:
- E o mais recente do Caetano, quem curtiu? Não percebi o sarcasmo da mulher, já que não parava de observar os seus dedos que feliz me fizeram um dia.
- Bernardo, você que é tão observador, qual é a sua opinião sobre o disco do Câe? Percebi, então, que a pergunta vinha a mim.
- Olha - odeio quando começo as frases com "olha" - não ouvi com muita atenção a nova peripécia do baiano, mas acredito que a nova fase vivida está lhe fazendo bem. Achei ótimo ele ter terminado com a Paula, ela era muito ditadora, deixou o melhor de Caetano escorrer pelas trilhas sem açúcar do cinema brasileiro. Foi sensacional ele ter incluído guitarras mais pesadas no álbum, sem falar das saborosas letras que ainda sabe com primor compor. Adoro aquela em que ele fala sobre um velho tendo um caso com uma pessoa mais nova. Tão lírica!
Não tinha percebido, mas todo mundo ao redor da mesa ficou prestando atenção no que eu estava falando: asneiras que sempre são encontradas no Caderno G da Gazeta do Povo. Pus pela garganta mais um pouco do vinho seco e cortei um pedaço da alcatra. Josué, o mais novo da turma, me olha carinhosamente e diz:
- Nunca pensou em ser jornalista? Respondo:
- Caro amigo, todos sabem que críticas são feitas por pessoas e não conheço nenhum jornalista que seja humano. Foi aí que arrumei briga com metade dos presentes. Os que não eram jornalistas, eram publicitários, com exceção de Isabel, que era Pedagoga. Eu mesmo, bacharel em Jornalismo, mas empresário experimental por culpa do meu pai, proprietário de uma grande rede de transportes.
- Você não passa de um esnobe reprimido, querido Bernardo. Às vezes Josué é tão ridículo que chega a dar ânsia. Todos riem e eu faço uma cara de cu. Aliás, como é uma cara de cu? Sei lá.
* * *
O jantar estava ótimo. Isabel troca o disco do Oswaldo por um da banda Justice. Ela sempre foi metida a moderninha, mesmo sendo pedagoga. Nenhum preconceito, ressalvo, antes que mais pessoas venham a me chamar de esnobe reprimido. Ela estava com um vestido azul, meio solto. As pernas ficavam à mostra, revelando anos de malhação nas linhas das coxas e das panturrilhas. Seu cheiro continuava formidável. Lavanda com alguns tons de madeira. Não lembro a marca do perfume, mas continuava o mesmo de sete anos atrás.
- Alguém conhece esta dupla francesa? Perguntou.
- Sim, adoro aquela canção do clipe das camisetas. Eu disse.
- Ah, ela se chama D.A.N.C.E, também adoro. Respondeu Isabel com um sorriso de fazer a Monalisa parecer mesmo um auto-retrato de Da Vinci.
Já meio alta por causa do vinho, ela tira Glauco, seu atual e meu mais perfeito rival - mesmo sem saber - para dançar. Arrasta a mesa da sala para o canto e inicia um rebolado que me fez ir ao banheiro. Engulo mais um pouco, dessa vez seco, o agora vinho tinto que tinha sido aberto. Quando volto, todos estão a dançar. É por isso que continuo a acreditar no poder da música. Lindas pessoas de 30 anos mexendo os quadris graças a batidas eletrônicas.
Minha formosa esposa, calçando um Christian Louboutin, me devora com os olhos, implorando um roçar de coxas. Atendo o pedido e acabo derrubando um pouco de vinho no Prada da mulher. A vida, naquele momento, podia ter terminado para mim.
- Não acredito!
- Pode acreditar, seu Prada agora está mais delicioso. Não sei como consegui profanar uma idiotice tamanha.
- Você é tão sem noção, Bernardo!
- Calma, é só um Prada Gisele. Josué não devia ter dito aquilo. Ele consegue ser mais idiota em horas de perigo. Fico imaginando ele no período da Ditadura Militar.
* * * Continua em outro momento