Meu nome é Leonardo Silveira Handa. Jornalista. Perdido. Achado. Amante. Radialista.

quarta-feira, dezembro 20, 2006

Marginal


Meu cinzeiro está cheio até a borda. Cada cinza ali jogada é uma lembrança assassinada. O período é de reciclagem mental, limpeza a mais para armazenar outras memórias. Tantas outras já foram perdidas em copos de café com vodca. Somente os períodos felizes ficaram gravados, todos bem registrados ao som de Devendra Banhart, como se fossem um filme em pré-produção.
Aos poucos um novo roteiro surge, com fúria, música, sujeira e prosa, repleto de grotescos erros gramaticais. Por vezes a dicção também se perde, surgindo sons interessantes de pura irresponsabilidade. Novamente o lado marginal brota das entranhas um licor de saudades. Eu sei muito bem que a sua presença não quer bebê-lo. Eu insisto. Você aceita.
A noite invade o recinto vazio do meu quarto. A janela ainda está aberta. Acesso fácil aos insetos que se sentem atraídos pela luz estrambótica. Somente os distraídos caem na armadilha traiçoeira do intento. A artimanha planejada conquista o eleitorado. Não demoro e destilo o veneno guardado em meus dentes. Meu ferrão artificial é a arma menos mortal. Ainda tenhos nas palavras o mortífero golpe de piedade. Como é doce a sensação do vencer, do conquistar, do estraçalhar.
O tempo passa e todos os atos vão se transformando em cinzas. Todas acumuladas devidamente no cinzeiro, até que ele fique cheio, quase derramando pela borda. Após, as lembranças são jogadas pelo ralo. E volta o círculo vicioso hiperbólico, redundante e presunçoso. É pura maldade e marginalidade. Assim o sorriso se abre na boca rachada de pura malícia.

segunda-feira, dezembro 18, 2006

Acabei de ler no site da Folha de São Paulo:

"O deputado Antonio Carlos Magalhães Neto (PFL-BA) foi esfaqueado nesta segunda-feira quando deixava seu escritório no bairro da Pituba, em Salvador (BA), por uma mulher aparentando ter pouco mais de 30 anos.O golpe atingiu o lado direito das costas do deputado, que passa bem e está em observação no Hospital da Bahia. Ainda não se sabe se ACM Neto foi vítima de um assalto ou se o gesto foi em vigança pelo reajuste dos salários de deputados e senadores para R$ 24.500".

Puxa, que pena. Essa mulher é sem noção, não acham?

segunda-feira, dezembro 11, 2006

Jack Kerouac Songs


"O que eu tenho? Tenho 35 anos. Uma ex-mulher que me odeia e que gostaria de me ver na cadeia. Um filha que nunca vejo. Um bolso vazio. Minha própria mãe, após todos esses anos de labuta e lágrimas, ainda rala o rabo numa fábrica de sapatos. E eu não tenho um só centavo, nem para uma puta que preste. Maldito seja! Filho da puta! Às vezes penso que a única coisa que está pronta para me aceitar é a morte. Nada nesse mundo parece me querer, ou lembrar-se de mim. Sabe o que acho dessa vida desprezível? Vou abandonar essa história de romances épicos e tentar concentrar meu talento - se é que tenho algum - no que quer que não seja escrever. O que sei é que existem apenas dor e desespero aguardando por nós todos, especialmente por mim. Sou o mais solitário escritor da América, e vou lhe dizer por quê: porque escrevi seis longos romances desde março de 1951 e nenhum deles foi aceito até agora, agora, AGORA!"

O trecho acima foi escrito em uma carta que Jack Kerouac desabafou a um amigo. Ainda bem que alguns existem. Poucas semanas depois dos versos em questão, On The Road foi lançado pela editora Viking e Keroauc se tornou um dos principais escritores da geração beat e a sua obra se tornou um clássico. Há esperança.

quinta-feira, dezembro 07, 2006

Moto-perpétuo


Alguém aí bateu na porta da solidão? Sabe qual é o sentimento mais fácil de ser alcançado? Quem adivinha a palavra mais generosa. "Quem sabe o que é ter e perder alguém".

A porta da solidão já foi aberta, há tempos. Se ela não existisse, o que seria do amor, o sentimento mais fácil de ser alcançado. Difícil é haver interesse mútuo. Um pode amar, mas outro pode desdenhar. Quando há encontro, aí sim, os fogos de artifícios são ouvidos de longe, muito longe. Melhor ainda acompanhado de um generoso obrigado, palavra cada vez mais esquecida por familiares, amigos, funcionários, colegas de trabalho, políticos, iconólatras e conhecidos virtuais. Como é complicado arrancar um obrigado de alguém. Pior são aqueles que criticam a falta de educação, mas não possuem educação alguma. E é assim que se tem e se perde alguém. Algo viciante. Moto-perpétuo.

Os tempos de hoje são tristes. Os olhares vazios não transmitem sentimentos. Corpos secos vagam em direções perdidas. No momento em que encontram outras pessoas, é o oco que prevalece. Por isso ainda existem os caras que insistem em bater na porta da solidão.

segunda-feira, dezembro 04, 2006

A Carta de Pero Vaz de Caminha

Então, recentemente recebi o primeiro lugar do Prêmio Amsop de Jornalismo, na categoria Crônica Temática. Conforme prometi, coloco o texto na íntegra aqui no blog. Foi bem bacana a premiação que, a cada ano, recebe mais trabalhos de comunicadores de toda região Sudoeste do Paraná. Parabéns a todos os vencendores. Valeu.

Como são engraçadas algumas situações do cotidiano, sobretudo em momentos de definições políticas. O mais atual pilhérico em questão é a cobrança e reivindicação que os políticos solicitam aos outros políticos. Tudo em prol – é lógico – da população.
Os itens de exigências podem ser conferidos, pelo menos os da região Sudoeste do Paraná, através da Carta do Sudoeste e, recentemente, na Carta de Pato Branco. Aliás, essas “Cartas” têm se mostrado meios eficazes para apresentar os anseios da localidade, resumindo em um geral as pretensões do perímetro sudoestino. Ambas as propostas são parecidas e tentam mostrar a situação da região.
No caso da Carta do Sudoeste, o chamariz é o municipalismo e desenvolvimento regional, projeto desenvolvido pela Associação dos Municípios do Sudoeste do Paraná (Amsop). Se as situações estratosféricas de olhares sinuosos enxergassem melhor sem a costumeira miopia, não seria necessário desenvolver um artifício dessa espécie em favor da região. Óbvio que o Sudoeste é esquecido. Por muitos é considerada a mais pobre e desprovida região do Paraná. E olha que a terra produz 5,5% do Produto Interno Bruto paranaense. Mas, caso fosse vista com o real potencial que possui, a situação poderia ser mais favorável.
Qualquer setor da administração se preocupa com os detalhes para que o todo seja redondo; que o desenvolvimento seja alcançado de maneira sagaz. E são esses detalhes que ainda emperram os joguetes praticáveis. O Sudoeste não possui ramal ferroviário. As rodovias necessitam, urgentemente, de modernização estrutural. A Estrada do Colono se tornou uma novela tão melodramática que poderia servir de enredo a qualquer folhetim mexicano, com direito a par romântico a fim de chamar a atenção do eleitorado. A agricultura é tão forte que está causando problemas até nas ações das intempéries que, por puro ciúme, já prejudicou inúmeras colheitas. O produtor rural vai se perdendo nas indefinições do sol, da chuva, do vento e do granizo, além das costumeiras promessas políticas.
A Carta do Sudoeste está procurando salvar certas questões que aos poucos enfraquecem os municípios dessas plagas. Alguns ficam isolados como se fossem ilhas sem mar e sem água, já que a estiagem deste ano causou transtornos indeléveis. Ela também mostra como está a situação da região, como Pero Vaz de Caminha fez ao descrever os contornos e aspectos brasileiros ao Rei Manuel.
Em metáfora à Carta de Pero, os municípios do Sudoeste, aos poucos, realmente estão com as feições pardas, nem tão avermelhadas assim. Os rostos e narizes não estão bons no momento, mas hoje em dia existe cirurgia plástica. Alguns andam nus, por falta de verba. Nem mais fazem caso de encobrir suas vergonhas. “Acerca disso são de grande inocência”(?). Os cabelos estão corredios. Eles andam tosquiados, “de tosquia alta, mais que de sobre-pente, de boa grandura e rapados até por cima das orelhas”.
As situações do cotidiano continuam engraçadas, uma pena acontecer somente em momentos de definições políticas. Em todo caso, Pero Vaz de Caminha pode auxiliar.

Leonardo Handa - Jornalista - www.leonardohanda.blogspot.com
Chega esta época e bate a retrospectiva. O passado recente adentra a porta da cabeça. Nada melhor do que deixar as janelas do cérebro receberem a canção Please, please, please, let me get what i want para ajudar a relembrar. Eu nunca soube, mas a música praticamente nasceu comigo. God times for a changes.

Rasbicando alguns pensamentos em vão, o retorno ao berço satisfaz a gratidão momentânea. O sorriso se abre como flor e pétala por pétala é arrancado no presente, aguardando, enfim, um futuro bom. Enquanto isso, os mesmos clichês repetitivos em bordões televisivos invadem os cérebros dos tranqüilos. Mas são os intranqüilos que dão mais vazão aos sentimentos que jogados imploram por atenção. Nem sempre são vistos com nobreza. O clichê, por si só, é uma pobreza repugnante. Porém, é nesta época que eles possuem sentido.