Meu nome é Leonardo Silveira Handa. Jornalista. Perdido. Achado. Amante. Radialista.

sexta-feira, fevereiro 24, 2006

Lisérgico

Tapa o buraco com notas dissonantes de pura felicidade. Oferece um sorriso colorido ao garoto recém expulso da puberdade. Grita letras distorcidas quando alcança um abraço. Escorre de alegria para um quarto de ácido qualquer. Abre seu diário e relata o beijo explosivo que fez deslizar sentimentos entre as pernas. Dilui um comprimido em seu uísque. Olha pela janela e enxerga pássaros cor de jumbo nadando em um céu de sangue. Ouve Hendrix. Flutua em espiral até o teto e perfura a lâmpada fluorescente. Fecha o olho. Abre o esquerdo. Não lembra o nome.
Um auto-tapa acorda o poeta que ele deixou enterrado nas flores de vidro trincado. Desliza a caneta pelo chão de carbono que ele rabisca frases metafóricas. Lembra da foda. Recorda a menina. Senta no vazio esperando por um trem que o levaria ao inferno. Imagina o diabo dizendo bom dia com cheiro de enxofre. Se vê salvo por anjos homofóbicos. Tritura rosas com os dentes de porcelana que uma elfa implantou, quando um dia ele dormiu e sonhou. Destapa o buraco e engole as notas dissonantes. Joga fora os livros da estante. Atravessa a via estúpida dos escritores performáticos que são referência em sua escola. Voa pela internet buscando prazer não alcançado. Acende um baseado. Forma figuras geométricas com a fumaça. Traga mulheres belas que rasgam suas calcinhas com o cabelo. Uma medusa paga um boquete deliciosamente lento. Ele pensa estar fazendo algo tântrico. De repente, chora.
Viaja até a parede esquerda em direção à rua de suas saudades mais complexas. Passa pela infância em que seu companheiro se chamava Teddy Bear. Ele o estuprava todo santo dia. Percorre o tempo e perde a sua virgindade. Não demora muito e ele a acha jogava de pernas abertas em uma mesa de sinuca com sete buracos. Fode com todos.
Desfruta mais um pouco do espasmo. Fica no chão escrevendo em sua mão escárnios poéticos. Come a verborragia em que preparou numa panela de barro e degusta com vinho chileno. Vômita as orações aprendidas na catequese e fecha novamente o olho esquerdo. Com os dois fechados, agora, ele dorme. Acorda. E dorme de novo. Boa noite, tristeza.

domingo, fevereiro 19, 2006

Sunday Blood Sunday

Acordo em um domingo de manhã com um gosto amargo na boca. Parece sangue. Acendo um cigarro e espirro desgostos de sentimentos. Tento me esconder no lençol, mas nada me abriga. Fico na solidão que eu mesmo me impus, sem ajuda, nem contribuição. Alguns tentaram levantar. Eu preferi ficar deitado. E agora as pétalas vão caindo sobre o corpo.
Ainda há gosto de sangue. Cuspo mais amargo. Encho a cara de depressão que percorre pelo meu ego detonado. Uma frieza cavalar estraçalha no meu peito uma dor absurdamente silenciosa. Recebo um ataque no olfato que logo me deixa surdo de razão. Deixo a vontade escorrer pelos dedos. Vejo um vulto passar correndo através dos meus olhos cegos. Talvez fosse eu mesmo.
A vida se transforma. Modifica. Danifica. Distorce. A mudança freqüente nos leva a caminhos nem sempre agradáveis. Tropeço na primeira pedra e caio. Tropeço sempre. Estou sempre no quase. Tudo pela metade. O sentimento mais bonito também é o mais ridículo. E o sangue continua na boca neste domingo.
Não me leve a mal, também não me leve a bem. Nem bom, nem mau. Vou ficar preso em uma nau, esperando o resgate que, provavelmente, não irei aceitar. Somente o próprio para se livrar e voltar. Um dia eu mando um fuck off.
Agora, aqui, expresso em dizeres nem muito objetivo, eu fico. Não te esqueço. Desejo o melhor para sempre. Os sonhos serão eternamente seus. Todo o sentimento bom para você. "Guarde um sonho bom pra mim".

terça-feira, fevereiro 14, 2006

Balada triste

Uma triste canção ao piano faz companhia. O quarto está esfumaçado. Farpas foram recém recolhidas com todo o desgosto de um fim prévio. O rapaz fugiu pelo retângulo mais próximo, sem dizer adeus, sem sorrir, sem amor. A outra figura ficou nas lágrimas que se suicidavam em queda livre e encontravam o lençol. Lá fora a luz em neon ainda insistia em permanecer acesa, invadindo sem licença pela janela do quarto de motel. E a balada triste continuava a embalar a tristeza repentina. Somente puxando pela memória para lembrar.
Um desespero surdo subiu em instante, estacionando na boca uma ânsia jacosa de tremor e ódio, mas, estranhamente, com um amor profundo, mesmo que perdido ele se foi. Ela não sabe dos sentimentos. Ela desconhece os dizeres. E ele não deu valor ao gostar, à paixão, ao companheirismo. Quando ficou sabendo da notícia, soltou um berro de proporções cavalares, fugindo da cama dividida a dois. Era um novo ser que estava sendo gerado, um acidente involuntário que ele não poderia dizer "eu te amo". Um desgosto.
Logo após o acontecido, um garfo pôs fim ao nascimento.

Texto oscariado

Voa alto rodando uma montanha do oeste frio, cortante e dilacerante. Rabisca com raiva um texto de sangue. Briga através da mídia com um figurão político. Dance como gueixa em dúvida natural. Suba em prédio novaiorquinos. Assassine atletas de religiões contrárias. Denuncie artimanhas dos poderosos. Teste vacinas em africanos. Escolha o seu sabre de luz. Entre em uma caverna repleta de morcegos. Veja o drama dos palestinos. Acompanhe a história de um casal de cantores. Acompanhe as divirgências culturais de raças e os preconceitos de Los Angeles. Estraçalhe o seu sentimento na história do transsexual que na realidade é mulher. Ria do bruxo inglês. Envolva-se com um rapaz que se apresenta orgulhoso. Mas, não tenha preconceito. Veja o novo Woody Allen. Dê gargalhadas vendo os pingüins fazendo uma longa travessia. Não leve a sério as filosofias do leão falante da terra gelada. Vença os alienígenas que ainda tentam invadir o planeta Terra. Termine tudo em um "Crash".

quarta-feira, fevereiro 08, 2006

Sentimental

Cuantas veces yo te dije
Que eso iba a cambiar
Yo nunca di motivo
Si tu me avisas
Me enseñas
Habla de lo que fue para ti
No va a librarme de vivir!

Quién es más sentimental que yo?
Yo dije y aun así, si pudo evitar.

De tanto decírtelo tu subvertiste
Aquello que era un sentimiento y así
Hiciste de él la razón
Para perderte en el abismo que es
Pensar y sentir.

Ella es más sentimental que yo
Así que parece que está bien
Si yo sufro un poco más.

Yo sólo acepto la condición
De tenerte sólo para mí
Ya lo sé, no es así, pero déjalo
Pero déjame que finja y ría.

(Rodrigo Amarante). Tradução em espanhol: L.S.H.

Elas

A beleza é um sistema monetário, assim como ouro. Como qualquer economia, é determinada pela política e, na idade moderna do Ocidente, é o último e melhor sistema de crenças que mantém a dominação feminina intacta.

Quarta Vez

Estrague o que eu fiz
Nunca fui bom
Em te deixar feliz
Nem agi de maneira exata
E você sempre
Me contradiz.

Arraste o pouco que ficou
Para outro lado da sala
Mas não diga que acabou.

Não quero desfazer a mala
Que nunca arrumei
Nem tirar da minha mão
A tua tala.

Eu sei que estou repetitivo
E escrevendo coisas sem sentido
É que estou brincando com os escritos
Que podem traçar algum destino.

De qualquer forma não me abandone pela quarta vez
Não desfaça a bela história que você fez. (E eu continuei).

L.S.H.

segunda-feira, fevereiro 06, 2006

S.U.B.

Noite. A tríade setentista evocada no Woodstock dá a razão. Vaza o exagero pelo beijo tecnicolor ao som de deuses ressucitados. Madrugada. Balada no peito fechado em claridade. Dissonantes sons provocados por deslizes deliciosamente frenéticos. O problema é lembrar, agora, do que foi bom. Não tem comparação. Acrescente Mojo Pin, do Buckley, com Califórnia, do Wainwright. Junte aos poucos Malemolência, da Céu, e despeje Barracão, da Rebeca Mata. Retorne ao ápice com No Surprise, do Radiohead. Agore goze com Brendan Benson. Relaxe. Everybody Hurts, do R.E.M., auxilia enquanto toques frêmitos satisfazem.
Manhã. Uma faixa de sol arrebenta-se pelo buraco da cortina, acertando a retina semi-aberta. Abre novamente para se deixar entrar. E recomeça o dia de freqüência, embalado o momento com Franz Ferdinand, Travis, Delgados e demais escoceses que também no copo pela metade se encontram.
Um bom dia, um obrigado, um beijo, um abraço.

quarta-feira, fevereiro 01, 2006

Texto antigo (pra pessoas antigas)

Um prazer intenso sentido nas pequenas coisas do cotidiano. Ouvir atentamente com os dois ouvidos abertos algum álbum do R.E.M. Ler um texto do Bucowski. Interagir vorazmente certa crítica musical ou cinematográfica. Tragar calmamente um cigarro. Ou então admirar uma obra incompreendida dos ano 80.

Curtir a chuva em um domingo qualquer. Estar acompanhado dos amigos durante a projeção de um filme mediano de um diretor conceituado. Assistir uma peça de teatro realizada por conhecidos. Jogar "escravos de jó" e como castigo beber Martini Rosé. Fazer do trivial algo orgíaco. Descobrir no comum as novidades imperceptíveis de tão normais que a vã filosofia não alcança por causa da rotina.

Acordar com um gosto azedo na boca, de causar sensação de repúdio quando lembramos da noite passada. Dar gargalhadas intermináveis relembrando situações constrangedoras. Gravar alguém vomitando porque bebeu demais.

Voltar ao passado com o auxílio da mente e dos retratos feitos com uma máquina fotográfica digital e com uma câmera de vídeo.

Mas, eis que surge o primeiro beijo. A primeira transa. O primeiro porre. O primeiro amor. A primeira árvore. O primeiro livro. O primeiro filho. O primeiro rompimento. A segunda briga. Vários porres. E o primeiro fim.